terça-feira, 22 de junho de 2010

MEU CONTO DE FADAS

Sete anos vivendo sob o mesmo teto e... discutindo muito. Sim, porque se alguém vive em constante harmonia com o marido eu ainda não conheci. E não vou ser hipócrita a ponto de afirmar que aqui em casa é diferente. Duas pessoas cheias de opinião, que gostam de se fazer de difíceis, educadas de maneira diferente, que de repente tem que dividir uma casa, uma filha, uma vida....não poderia ser diferente. No começo foi ainda mais difícil. Menininha mimada, cheia de ilusões, despencando do alto da sua ingenuidade e descobrindo que príncipes encantados não existem e que o homem que te ama não necessariamente vai satisfazer todos os seus luxos e vai te encher de mimos 24 horas por dia e vai responder seus desaforos e mau humor te enchendo de beijos. Mas, com o tempo, fui me recuperando da queda, fui amadurecendo e entendendo. Entendendo que ele foi o único com quem eu tive vontade de me casar e, provavelmente, o único com quem terei. E não foi uma vontadezinha qualquer. Eu tinha certeza de que era com ele que eu queria ficar desde o primeiro beijo e que alguma coisa muito diferente de tudo o que eu tinha vivido até então ia acontecer a partir daquele momento. E foi assim porque ele era (e continua sendo) tudo que eu sempre quis: inteligente, pertinente, educado, carinhoso, com um jeito de ver a vida parecido com o meu, com objetivos parecidos com os meus. E as diferenças e as dificuldades que o casamento, eventualmente, trouxe à tona não apenas foram insuficientes para encobrir essas características como serviram para evidenciar outras mais. Hoje eu sei, por exemplo, que ele é um pai fora de série e, importantíssimo, me ajuda a cuidar de mim e da minha vida como nem eu mesma sou capaz. Nesse período extremamente conturbado e estressante que estou vivendo, eu só não me desespero completamente porque conto com sua ajuda pra absolutamente tudo: pra fazer compras, pra ir à feira, pra buscar e levar a Clara, pra fazer a janta, pra me deixar dormir um pouco mais cedo quando chego em casa exausta, pra me deixar chorar até me acabar quando me dá vontade, pra me fazer relaxar e esquecer as coisas chatas quando eu mais preciso. Enfim, dá pra querer alguma coisa diferente? Acho que, transpondo os contos de fada pro mundo real, eu posso sim dizer que encontrei meu príncipe encantado. Talvez não aquele que vai lutar com o dragão e com a bruxa pra ficar comigo ou vai construir um castelo em minha homenagem, mas, certamente, aquele que vai me fazer feliz para sempre.

domingo, 13 de junho de 2010

MINHA MÃE, COM MUITO ORGULHO

Já falei que minha mãe é especial? Pois ela é. Sempre foi uma mãezona, super presente, atenta e preocupada e que, modéstia a parte, criou três filhos ótimos. Cheios de caráter, dignidade e bons valores. Enfim, somos tudo de bom graças a ela. Agora ela está quase chegando nos 60 anos, aquela idade que a vida começa a acalmar e sobra um pouco mais de tempo pro tricô, pro patchwork, pra cozinha e pras palavras cruzadas. Mas minha mãe resolveu dedicar esse tempo pra se tornar uma fera no videogame, tocando guitarra como poucos, e pra bater records em cima de records nos jogos do computador. E filho, que não é coisa fácil, resolveu pegar no pé. Ela, cansada de tanta encheção, escreveu esse texto pra desabafar. Que eu chorei e chorei quando li e nem pedi permissão pra ela pra colocar aqui (mas acho que ela não vai se importar).

Então, com a palavra, minha mãezinha.

Agora, depois dos 50, me descobri adepta e viciada em joguinhos de computador e videogames, estando sempre em busca de superar fases, bater records e gastando nisso incontáveis horas, com uma persistência que foi classificada de "doentia”. Esse julgamento e, certamente justa condenação, me levou a refletir muito sobre tudo que fiz na minha vida até agora e me questionar sobre essa perseverança que sempre me acompanhou. Será ela realmente uma compulsão patológica?

Na infância e adolescência usava o mesmo vestido não em duas ou três festas mas em vinte ou trinta, enquanto ele me coubesse (e SEMPRE cabia) me impondo numa sociedade que supervalorizava o ter, a aparência, os trajes variados, modernos e de tecidos importados. Entrava em botecos de categoria duvidosa para pedir ao pai alcoólatra, que procurasse manter-se sóbrio para comparecer a algum evento escolar, insistindo em manter esse pai totalmente ausente e já esquecido pelos outros filhos, participante na minha vida, assinando meus boletins, etc. Carregava esse pai bêbado para casa com a ajuda dos amigos, de quem morria de vergonha, quando o encontrava à noite nas ruas, encostando-se às paredes, sem conseguir sustentar-se nas pernas.

Fazer dois cursos de nível médio? “Nunca vai conseguir, outros já tentaram e desistiram. O magistério tem estágio pela manhã, aulas à tarde, incontáveis trabalhos. O científico tem matérias difíceis, não terá tempo para tudo”, vaticinaram os professores. Esses mesmos professores fizeram todo o possível para atrapalhar, não me dispensando de trabalhos extras e cobrando até que desfilasse no “dia da pátria” para ambos os cursos. Mas não só consegui como fui a primeira aluna e oradora da turma nos dois cursos. E lá estava meu pai, todo orgulhoso (e sóbrio, graças à campanha de uma semana toda) me entregando, no mesmo evento, primeiro um, depois outro certificado.

Estudar em Curitiba? Como? Não temos a menor condição financeira. Dá-se um jeito. Moro com essa tia praticamente desconhecida, sou babá do seu mimado filho, aguento o ranzinza marido que, entre muitas outras avarezas e antipatias, desliga eletricidade do chuveiro em pleno inverno para que eu não dê mais despesa do que já dou. O pior, caio no fundo de um poço ao descobrir que ser a melhor aluna na minha cidade significa a mais profunda ignorância em termos de vestibular e faculdade. Me apavoro, me deprimo, recuo nos relacionamentos. Menina pobre e caipira, com medo de usar o telefone, sem coragem de se comunicar com ninguém, sem família, sem amigos, fechada no apartamento sozinha aos domingos. Desisto? Não, jamais. Hei de aprender TUDO isso que me parece grego. Noites inteiras acordada estudando, devorando apostilas de 10 a 14 horas por dia. No segundo ano já recuperei a autoconfiança, sentindo-me capaz sim e, incrível, entrei em medicina na UFPR, única faculdade em que, por questões financeiras, me foi permitido prestar vestibular.

Depois de superada a tristeza de perder o pai, tristeza não tão intensa devido à sua ausência cada vez maior nos últimos anos, uma fase muito boa. Começo de faculdade, morando com a mãe, o irmão e, logo depois, com a prima; novos amigos, muita alegria.

Inesperadamente um filho. “Não podemos levar essa gravidez adiante. Não podemos nos sustentar. Precisamos estudar, terminar os cursos. Agora? No internato? Dormindo em casa só em noites alternadas? Como?” Não sei. Mas desistir? JAMAIS! Filho que não dormia hora nenhuma, pilhas de fraldas para lavar e passar, inúmeras mamadeiras para preparar antes de ir para o HC, feira às 6:00 hrs. Noites passadas no PA da pediatria cuidando dos filhos dos outros e chorando por saber que o seu estava doentinho em casa e o que mais queria era estar com ele. Desânimo? Não, só alegria, disposição e amor pra dar. Aí a persistência foi também do maridão e da mamãe. E vejam só, conseguimos nos formar, contra as apostas de todos, até de nossos pais.

Depois de formada, a vida estabilizou-se. Uma filha, mais alegria em nossas vidas. Situação financeira bem melhorada. Mas, residência com dois filhos pequenos não dispensa imensa dose de teimosia. Mais um filho, alegria triplicada. Tudo ótimo. Ops, tudo? Manter o casamento e a união da família foi, talvez, o maior exercício de paciência e tenacidade da minha vida. Nisso investi muitas noites e bati incontáveis records.

Criar três filhos, educando com carinho e paciência, em meio a trabalho muitas vezes exaustivo é função que todas as mães conhecem mas que desempenhei sempre com muita dedicação. Reunião na escola? Não podia faltar, trocava plantões absurdos, pagava noite por dia mas acompanhava meus filhos nos momentos importantes de suas vidas, conhecia suas necessidades, qualidades e fraquezas. "Livro do mês? Vamos lá. Eu leio um parágrafo e você outro. Dificuldade com matemática? Fazemos campeonato de expressões. Você faz aí e eu aqui, vamos ver quem termina primeiro e corretamente”. Futebol? Vamos lá torcer. Ballet? Corujíssima em todos os espetáculos. Quantos ensaios madrugada a dentro. No dia seguinte trabalho cedo? Qual é o problema?

Filhos crescidos preocupações dobradas ainda insisto em aconselhar quando eles não querem nem partilhar, cobrar quando não querem comunicar, aplaudir quando não se exibem, compreender quando não explicam, zelar quando parecem se destruir. Sou assim. Perdi quantas vidas no joguinho? Mil, duas mil, disseram os filhos que viram lá os meus índices. Puxa, gasto muitas horas jogando! Quantas despendo trabalhando, cuidando, doando? Esses cálculos ninguém fará por mim, mas eu mesma concluo o óbvio: sou doentia e compulsivamente persistente!
 
 
Mãe: é tudo a mais pura verdade, felizmente. Me sinto tão injusta por reclamar e me sentir imensamente triste apenas por não me sobrar tempo pra fazer tudo o que gostaria. Me sinto tão fraca por não aguentar o ritmo da minha vida, que é, e sempre foi, infinitamente mais tranquila e fácil que a sua. Quando o desespero bater, vou lembrar de ler esse seu texto, pra me inspirar e tentar seguir seu exemplo. E o que você não pode nunca esquecer é que filhos e genros e noras vão sempre achar um jeito de te criticar e isso nem é exclusividade sua; tenho a impressão de que acontece com muitas mães (espero também não me esquecer disso quando chegar a minha vez). E você já passou do tempo de se preocupar com o que os outros pensam a seu respeito e tem moral pra fazer o que bem entender pro resto da sua vida. Por isso, por favor, ignore, continue fazendo o que você acha certo, o que te dá prazer. Porque essa é a minha mãe: viciada em videogame, por dentro das últimas piadas da internet e dos últimos vídeos do youtube, com um telefone no lugar do fogão, sempre atrás de novos desafios e novos records a quebrar e capaz de fazer qualquer coisa e de abdicar de tudo, tudo mesmo, pra ter seus filhos e netos por perto. E sabe de uma coisa mãe: você vai ser uma velhinha muito mais esperta e inteligente do que as tricotadeiras e confeiteiras.

domingo, 6 de junho de 2010

APRENDIZADOS

Clara entendendo como as coisas funcionam.

Eu e ela no carro, voltando para casa no domingo, seis horas da tarde. De repente, um baita de um engarrafamento, trânsito completamente parado a duas quadras de casa. Eu:

- Ai que droga! Tem uma blitz bem ali na frente.

- O que é uma blitz mãe?

- É quando os policiais param alguns carros para verificar se está tudo certo com os documentos do carro e do motorista.

- Quando roubaram o carro do pai ninguém parou o ladrão pra ver se estava tudo certo com os documentos.

Eu tentando defender os policiais:

- Pois é. Às vezes os policiais têm azar e só param os motoristas que estão com tudo certo e deixam justamente o ladrão passar.

- Mas nós avisamos os policiais que o ladrão tinha levado nosso carro. E ele foi até Joinvile com o carro e ninguém parou?

Eu já sem argumentos:

- Pois é...

E a Clara com sua brilhante conclusão:

- Esses policiais são uns toscos mesmo.

E nem fui eu que falei.