sábado, 11 de dezembro de 2010

É LENDA

Não acredito em grávidas que passam a gestação toda sorrindo, em paz com o mundo e se achando a mais linda e abençoada das criaturas. Com certeza é muito legal ter um serzinho crescendo dentro da gente, mas e os enjoos, as tonturas, os quase desmaios, a moleza, o cansaço, a preguiça, a vontade de nunca mais fazer nada na vida, o humor muito doido? Será que alguém é realmente capaz de passar ilesa por tudo isso? E as neuras? No começo, o único indício de que você está grávida é o seu mal estar. Daí, um belo dia a gente acorda sem enjoos e tonturas. Conclusão: deve ter alguma coisa errada. Dia seguinte acorda passando muito, muito mal. Conclusão: deve ter alguma coisa errada. Depois de um tempo a gente finalmente começa a sentir o bebê mexendo e acha que as nossas preocupações vão diminuir. Engano. Um dia mexe quase nada, outro dia mexe demais da conta. A conclusão? Só pode ter alguma coisa errada. E a responsabilidade? Exercício sim, mas sem se cansar demais. Alimentação saudável, com muita fruta e verdura, mas sem toxoplasmose. Cuidado pra não ficar doente, cuidado com o remédio que toma, com o creme que passa no rosto, com o colírio que pinga no olho, com os animais de estimação, com o sal, com o doce. Fica bem fácil. E acho tão engraçado quando, depois de tudo isso, vem o médico e fala “Sua gravidez vai muito bem. Vida normal pra você”. E eu sempre me esqueço de falar "Ei, quem disse que a minha vida normal é assim?".




P.S. Estou eu aqui só reclamando, mas devo dizer que adoro estar grávida. Apesar de, em certos momentos, parecer terrivelmente assustador, o fato de que uma pessoa completa está se formando dentro de mim e que de mim depende boa parte do sucesso desse empreendimento também me enchem de orgulho e felicidade e fazem com que eu adore as minhas tonturas, minha indisposição e todas as restrições que fazem parte da minha vida nesse momento.



segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

UM ANO QUE EU NÃO QUERIA QUE ACABASSE

E não é porque ele foi maravilhosamente bom ou especial. Aconteceram, sim, coisas boas, muito boas. E aconteceram coisas não tão boas assim. Tudo, enfim, como costuma ser em um ano ou em um período de tempo qualquer. O motivo da minha resistência em deixar que ele se vá é a minha imensa dificuldade em lidar com mudanças. Sempre foi assim: todos os momentos que representaram mudanças mais intensas na minha vida foram vividos com uma boa dose de sofrimento. Mas eis que o tempo passou, eu tive uma filha e a maturidade pra lidar com essas situações... não chegou. Era essencial que tivesse chegado, porque mães que não sabem lidar bem com mudanças estão completamente perdidas e condenadas aos mais cruéis momentos de angústia e sofrimento. Porque filho muda. Muda muito. E a cada três ou quatro anos experimentam um grande rompimento com a fase anterior. Rompimento que eles sentem e do qual se orgulham enormemente. E daí vai explicar a mãe que, em vez de comemorar junto e demonstrar o orgulho que, obviamente, também está sentindo, chora feito uma obsessiva compulsiva. Criança não entende, pai da criança não entende, nem a mãe da criança entende direito. Só entende que é difícil. É difícil demais perceber, de uma hora pra outra, a mudança física, as mudanças dos gostos, das brincadeiras, do vocabulário, dos interesses. E é com lágrimas nos olhos que me sento ao lado dela, radiante de felicidade, para preencher a matrícula para o próximo ano letivo e conferir sua produção desse ano: livros e cadernos preenchidos com contas, letras lindamente desenhadas, historinhas de sua própria autoria. E a vontade é de dizer “Chega, não quero mais ver isso. Eu quero as folhas rabiscadas, a mãozinha contornada no papel, os desenhos extremamente mal pintados. Isso sim me deixava confortável”. E agora me vem à cabeça outro momento, há exatos três anos, que sofri com tanta intensidade quanto estou sofrendo agora. Na ocasião, a Clara, com a pureza e com a mente tranquila que só as crianças de três anos conseguem ter, disse para mim, que me entregava sem amarras à imaturidade dos meus 30: “Mãe, o tempo passa. Eu não posso ter três anos pra sempre”. Eu sei e me orgulho imensamente das suas conquistas e da pessoa que você está se tornando. Só que às vezes dói um pouquinho.